O texto
que a seguir se transcreve foi retirada da Monografia sobre São Simão do Sr.
Joaquim de Oliveira. Seria um acréscimo à cultura desta região se esta
monografia vissem a sua publicação tornada realidade. Fotos Bernardo Ramos
VILA FRESCA DE AZEITÃO
Quando se fala no topónimo "Vila Fresca" , há que previamente ter em conta, o
que em termos administrativos urbanos, significava na época da sua fundação, o
termo "Vila" .
Joaquim Rasteiro, in, "Quinta e Palácio da Bacalhoa" (1895) a este respeito diz
que "(...) Vila, como é sabido, não designava, mesmo entre os Portugueses, a
povoação sede municipal, mas a quinta com casarias, e assim se dizia villa
urbana ou villa rustica, conforme era habitação de senhores ou predominavam
n'ella as officinas agrárias.
A
Villa italiana, essa vem até nossos dias, e modernamente, vemos ir-se entre nos
também, recebendo a locução para designar uma casa de campo com jardim, horta,
etc.
Aldeia, é bem sabido que não significava, como hoje, apenas a pequena povoação
rural, mas era quasi o monte alentejano, um agrupamento de construções para
acomodação do pessoal dependente da quinta e comprehendendo as officinas.
Era cavalleiro villão, segundo os antigos foraes, o homem que possuia uma aldea,
uma junta de bois, 4 ovelhas e um burro.
(Et
qui habuerit a deam, et uno iugo de bois et oues et uno asino et duos lectos
comparet caua um . in, Foral de Sesimbra e Palmela.)
Dentro destes parâmetros , a povoação criada a partir da
Quinta de João Martins era uma aldeia chamada Bila
feixe.
E,
esta povoação foi evoluindo dando origem à clássica formação urbana, na base
de uma propriedade agro-pecuária, tendo ao centro a casa senhorial rodeada
pelas instalações agrícolas e as moradias para o pessoal, não faltando a igreja.
Tornou-se ainda, centro mercantil onde acorriam as populações circunvizinhas,
daí que a aldeia se transformou num centro populacional evoluido, caracterizado
pela actividade religiosa, administrativa e jurídica, alcançando a categoria de
Vila e Sede de Município.
Sobre Vila Fresca, uma informação avulsa, datada de 13 de Novembro de 1887,
Oliveira Parreira escreve: "(...) Esta aldeia é antiquíssima e é toda rodeada
de quintas com lindos pomares de laranja que a lepra das laranjeiras tem
destruído completamente. Dois morgadios aí tinham como sede dois grandes
palácios. Um é o Palácio dos Casares, da Casa de Sabugosa, outro, o Palácio da
Bacalhoa, fundado, ou antes reedificado por Afonso de Albuquerque, filho do
grande conquistador das Índias.
Mais
tarde, em 1895, Joaquim Rasteiro escrevia que "(...) A Aldea de Villa Fresca
era pois o agrupamento de habitações junto à Quinta-Fresca, logar de residência
dos caseiros, lavradores, foreiros, arrendadores e mais pessoal dependente
d'aquella propriedade e participe dos seus privilégios e franquias ..."
In, Enciclopédia Geográfica
Vila Fresca
"Freguesia do Concelho e Distrito de Setúbal, Diocese de Lisboa. Orago, São
Simão. É também designada por São Simão de Azeitão.
Vila Fresca, dista 10,5 Km. da sede do Concelho e está situada na estrada de
Cacilhas a Setúbal, entre Vila Nogueira e Vendas. Tem serviço de Correios,
escola primária, filarmónica, fábrica de lacticínios do afamado queijo de
Azeitão ... "
Do
riquíssimo património construído de Vila Fresca e das outras povoações que
constituem a Freguesia de São Simão de Azeitão, em capítulo próprio se falará
dele.
A Dança dos Nomes
O
primeiro documento que se conhece onde aparece escrito o nome
de Vila Fresca é do tempo de Dom João I e datado de 1432. No entanto, nesta
altura
Billa Feyxe era a quinta, sendo a
aldeia chamada de João Martins.
Diz
o documento :
"Em
nome de Ds. amem. Saibam qntos esta cta de pura veda. birem q na era do nacim.to
de nosso senhor Jhu xpo de mill e q.tro cetos e tnta e dous anos ... em azeitã
... ts. queste pssetes foram alv.o afom brnca e Lço. affom de billa feyxe ... "
A
quinta passou de Quinta de João Martins Palhavã para Quinta de Dona Sancha de
Palhavã e depois para Villa Feyxe e Villa Fraiche .
A
aldeia chamou-se de Aldeia de João Martins e depois da quinta mudar de nome
também a Aldeia mudou de nome.
Sobre a evolução do nome da quinta e da aldeia, Joaquim Rasteiro, no seu livro
sobre a Bacalhoa, (1895) diz o seguinte :
"(...) Eu, porque nunca encontrei escripta nem conheci tradicionalmente
designação propria disse que a quinta apenas tem sido chamada do nome dos seus
possuidores, assim :
-
Quinta de Azeitão em Ribatejo por ser aqui situada ;
-
Quinta de S. Simão por ser próxima uma ermida d'esta vocação ;
-
Quinta da Condestablessa, durante a administração da viúva do condestável D.
Affonso, na menoridade de sua filha ;
-
Quinta de Affonso de Albuquerque depois da compra por elle feita aos Villa Real
;
-
Quinta da Bacalhoa, pelo casamento de D. Jerónymo Manuel, "o Bacalhau" com D.
Maria de Mendonça.
Do século XV nenhum documento conheço que nomeie a aldea de Villa Fresca,
enquanto que para fazer conhecida a situação de uma propriedade se cita a quinta
da Condestablessa.
Depois, no século XVI, encontra-se escripta aquella designação sempre a modo de
aproximar a pronuncia franceza Villa-Frexe , Villa Freixe, Villa Fréche, Villa
Freiche. O theatino D. Manuel Catano de Sousa, que não nasceu n'esta aldea, mas
por ali perto foi creado, diz em fins do século XVII, que este Freche é do
francêz Fraiche. O equivalente portuguêz Fresca, começa a aparecer já meiado o
século XVII e é geralmente admitido no século presente ...
... A Villa Fraiche como hoje é (1895) se escreve, ou Villa Freche, no frances
aportuguezado de então, seria a quinta.
Finaliza o ilustre azeitonense a sua tese dizendo :
"... Tenho pois que o primeiro nome da Bacalhoa pela posse de D. Brites, foi
Villa Fraèche ou Fresca servindo a locução portuguesa e a palavra villa seria a
designação que o architecto italiano lançou sobre os desenhos".
Numa
nota à margem do texto supra, feita pelo Padre Manuel Frango de Sousa, está
manuscrito o seguinte :
"Portanto
não leu os documentos do Convento da Piedade nem do Convento do Salvador, pois
neles se fala em Villa feixe.
No sec. XV escrevia-se aldeia de billa ffeixe e ffeiche ..."
Noutro local do
texto, e igualmente em nota manuscrita, o supra citado Pároco, faz assim a
cronologia da evolução do topónimo:
Escreve assim :"(...) Depois de ter feito a pesquisa em documentos encontrei
:
1432 - 1433 - Billa ffeixe
Que podia ser Freixe ou fréixe . O 1º. caso é de freixo , árvore, o 2º é a
pronúncia do francês "Fraiche". No mesmo documento aparece ffeixes que quer
dizer freixos, árvores ;
1570 - Villa feihxe
No documento em que os fregueses de São Simão se comprometem a manter o pároco
;
1630 - Villa fresca e Villa feixe.
No mesmo documento estão as duas fórmulas. É uma escritura que existe no Tombo
da Igreja ;
1636 - Villa Fresca ( em escritura )
1639 - Villa feixe ( em acento de óbito )
1659 - Villa Fresca
1643 - Villa Fresca
1644 - Villa Fresca - (em escrituras)
1672 - Villa Fresca
1694 - Villa Fresca
1714 - Villa Fresca
O mesmo autor na "folha" da paróquia, "Azeitão, A
Nossa Terra" nº. 8 , de 16 de Novembro de 1987, a este respeito acrescenta :
"(...) O nome fraiche ou fresca vem-lhe de se usar francês na côrte de Dom João
e Dom Duarte e do sítio ser mesmo fresco em virtude da grande abundância de água
que corria do Rio de São Simão.
Este rio era a maior fonte de toda a área de Azeitão..."
Por
sua vez, a "Enciclopédia Geográfica" trata o assunto da seguinte forma :
"(...) Quanto ao topónimo hoje principal : Vila Fresca de Azeitão, foi chamada
até 1759 Aldeia de Vila Frèche, declara sem mais explicações Joaquim Rasteiro,
que acrescenta : «creio que primitivamente era a Aldeia ou como se diz no
Alentejo, o Monte da Quinta Fresca que é propriedade do Infante D. João, Mestre
de Sant'Iago ».
Não explica, porém como é que primeiramente se dizia Fresca. Talvez razões
fonéticas expliquem a primeira alteração ; uma correcção erudita, eclesiástica o
regresso à primeira forma.
Não explica igualmente como é que a primitiva designação Quinta Fresca, ou
melhor, Quintão Fresca passou a Vila Fresca, alteração análoga de Quintão de
Nogueira para Vila Nogueira que se esclarece por causas municipais do concelho
de Azeitão.
Seja como for o topónimo é relativamente recente e teve princípio que é afinal o
do povoamento da propriedade quintã daquele Infante, filho de D. João I.
Também o Padre Manuel José de Távora, Pároco da
Freguesia, num seu relato de 1758, a determinada altura escreve que : "(...)
Vila Frexe a que antigos chamavam com grande acerto Villa Fresca, pelo muito
ameno que de quintas esta Aldeia tinha ... "
Quanto ao que se estabeleceu na tradição oral, a
versão tem contornos de Lenda, a qual, me foi contada assim :
-
Era uma vez ...
...
A Rainha que tinha vindo passear por estas bandas, a certa altura, teve sede, e
mandou, que lhe procurassem uma fonte de água pura, para a saciar. Trouxeram-na
até Vila do Freixo, onde se
apeou, e na fonte de São Simão, bebendo das suas águas fartas e cristalinas,
matou a sede ...
...
Depois, foi até às "Entrecercas" , onde se deliciou sob a sombra das seus
soberbos plátanos e graciosas faias. Aspirou os ares puros e refrescantes da
amena brisa, que lhe trazia os odores perfumados e inebriantes das tílias e dos
jasmins, que vindos das Quintas do César e da Má-Partilha, perfumavam os ares .
...
Tão deliciada ficou que, indagou da comitiva como se chamava o sítio onde tão
bem se sentia .
-
Vila do Freixo,
disseram-lhe ...
-
"Que passe a chamar-se Vila Fresca"
! ordenou a Rainha
Assim ficou, para sempre ! Palavra de Rainha !