| Litoral  
                  
                A praia do Portinho da Arrábida 
                (Figura 20), que se encontra embutida numa pequena reentrância, 
                tem uma localização e orientação que lhe confere características 
                particulares perante a agitação marítima local.   
                
                
                  
                Figura 20 
                Mesmo quando está sujeita a 
                ondulação com rumos para Sul do Oeste (situação para a qual o 
                litoral meridional da Península de Setúbal se encontra mais 
                exposto), esta praia caracteriza-se por uma grande dispersão da 
                energia da ondulação. A presença de uma bastante extensa 
                plataforma submarina (extensão superior a 10Km) e onde a 
                batimetria normalmente não ultrapassa os 5m (Figura 21), 
                contribui para uma grande absorção da energia que as ondas 
                libertam durante a rebentação. Deste modo, todas as condições 
                naturais se conjugaram para a formação de uma praia 
                excepcionalmente estável (Teixeira, 1990).   
                 
                
                
                 
                Figura 21    
                É na “Pedra da Anixa” nesta 
                praia, que se regista o ambiente de menor hidrodinamismo das 
                praias do litoral ocidental e meridional da Península de 
                Setúbal, apesar da dimensão das suas areias serem idênticas às 
                encontradas nas praias mais energéticas do arco 
                Caparica-Espichel.   
                  
                Figura 22 
                Isto pode-se dever à sua 
                alimentação a partir do delta submarino do Sado; como não há 
                contribuições significativas por parte das arribas e/ou das 
                linhas de água que desaguam nesta enseada, a única fonte 
                disponível é a extensa praia submarina de declive muito suave, 
                que constituí parte do delta de vazante do Rio Sado (Teixeira, 
                1990). Os depósitos da praia submarina são constituídos 
                essencialmente por areias grosseiras (entre 2mm a 0,5mm), 
                litoclásticas, com teor de carbonatos inferior a 30% (Matos 
                et al., 1990 in: Teixeira, 1990), bem calibrados.
                
                 
                 O Estuário do Sado constitui o 
                limite Sudeste da Península de Setúbal, ocupando uma área de 
                cerca de 13500 ha, formando uma Zona Húmida que tem um elevado 
                valor económico e paisagístico, estando inclusive incluída na 
                Reserva Natural do Estuário do Sado (R.N.E.S.). 
                 
                 Na região situada a montante 
                apresenta fundos baixos, onde se podem encontrar vastas 
                extensões de sapais e rasos de maré (Marateca, Carrasqueira e 
                Comporta), e também bancos arenosos (Ilha do Cavalo). Para 
                juzante a navegação faz-se através do Canal da Setenave, que tem 
                profundidades entre 5 e 11m e que termina na região da 
                Embocadura. Neste local o estuário inclui dois canais, Norte e 
                Sul, separados por bancos arenosos (Campanário, Cabra, Cabecinha, 
                Carraca e Escama Ferro), que convergem mais a juzante no 
                alinhamento entre Albarquel e a ponta de Tróia, atingindo-se 
                profundidades de cerca de 45m (Quevauviller, 1984/85).
                
                 
                O canal de navegação da Barra 
                de Setúbal (no estuário exterior9, corta um extenso banco 
                arenoso de forma triangular, com pouca profundidade, que 
                constitui o Delta Submarino do Sado. A Norte deste canal podemos 
                observar os alinhamentos arenosos de Alpertucho e da Figueirinha, 
                constituindo este último uma barra marginal do canal de 
                escoamento. O seu análogo na margem Sul é o bordo Oeste do banco 
                do Cambalhão que enraíza na Península de Tróia por alturas da 
                praia do empreendimento Sol-Tróia (Figura 22). A Península de 
                Tróia que é responsável pelo confinamento Oeste do Estuário do 
                rio Sado, é uma zona arenosa bastante extensa, enraizada 
                sensivelmente à latitude do Carvalhal e cujo crescimento para 
                Norte obriga à defecção da foz da ribeira da Comporta, criando 
                condições próprias à deposição de sedimentos lodosos onde se 
                pratica a cultura do arroz. 
                 
                 O arco litoral Tróia-Sines apresenta 
                características geomorfológicas e fisiográficas típicas de 
                “praias de enseada”, que são análogas às registadas no arco 
                Caparica-Espichel. 
                
                 
                Serra 
                
                O Portinho da Arrábida está situado a Sudeste 
                do relevo mais imponente da península de Setúbal – Serra da 
                Arrábida – que atinge o seu ponto mais alto aos 501m de altitude 
                (Formosinho). Este relevo alonga-se por cerca de 10 Km com 
                orientação geral Nordeste-Sudoeste. 
                A Serra da Arrábida tem uma 
                estrutura bastante complexa; é formada por um anticlinal 
                assimétrico com vergência para Sul (figura 23).   
                
                
                 
                Figura 23 
                No flanco Norte desta estrutura afloram todas 
                as unidades compreendidas entre o Liássico 8Jurrásico inferior) 
                e o Miocénico, aumentando a inclinação das camadas à medida que 
                se caminha para Sul, e diminuindo novamente na zona de charneira 
                do anticlinal do Formosinho (Kullberg & Kullberg, 1996). Neste 
                flanco podemos observar rochas de várias naturezas: dolomitos, 
                calcários, margas, argilas, arenitos, conglomerados e areias.
                
                
                 
                A vertente Sul da Serra da Arrábida, que é 
                muito abrupta, é constituída pelos Dolomitos do Convento 
                (Jurássico inferior a médio). O traçado desta vertente é 
                determinado por um grande cavalgamento basal que afecta o 
                Miocénico do Portinho da Arrábida a leste, e se prolonga para 
                Oeste pelo vale da Mata do Solitário. É esta imponente escarpa 
                litoral que confere `serra da Arrábida a sua originalidade, onde 
                podemos observar formas de erosão marinha e sub-aérea; da 
                primeira destacam-se as arribas litorais e as rechãs; da 
                segunda, destacam-se as cornijas e respectivos depósitos 
                coluviais (Manuppella et al., 1999). 
                
                 
                 Outro relevo importante da 
                região da Península de Setúbal, embora tenha dimensões mais 
                reduzidas (2Km de comprimento e 392m de altitude), é a Serra de 
                São Luís. A estrutura geológica é semelhante à que se observa na 
                Serra da Arrábida, também corresponde a um anticlinal 
                assimétrico, cavalgante para Sul, com núcleo constituído por 
                dolomitos (Jurássico inferior a médio) e pelos Calcários de 
                Pedreiras (Jurássico médio) (figura 24).
                  
                 
                
                
                 
                Figura 24 
                 A rede hidrográfica que 
                circunda a Serra de São Luís (ex: Ribeira de Alcube), erodiu 
                preferencialmente litologias de natureza mais branda como é o 
                caso dos Conglomerados de Comenda e as Argilas,
                Arenitos, Conglomerados e Calcários do Vale de 
                Rasca (Jurássico superior). 
                 
                O contacto entre a extensa 
                planície a Norte, e o conjunto de serras que foram anteriormente 
                descritas (Serras da Arrábida e S. Luís), faz-se através de um 
                relevo contínuo, estreito e de traçado sinuoso, formado pelas 
                Serras de S. Francisco (a Oeste) e Serra do Louro (a Este). 
                Estas, que culminam a altitudes entre os 200 e os 256m, 
                constituem a 2costeira”, ou seja, um relevo dissimétrico, 
                desenvolvido numa estrutura monoclinal, em que uma das vertentes 
                concorda com a inclinação regional das camadas aflorantes, mais 
                resistentes, e a outra corresponde a talude abrupto, geralmente 
                escavado por vale bem encaixado. Constitui uma nítida divisória 
                de águas. Os pontos culminantes correspondem às camadas mais 
                resistentes, de natureza calcária, do Paleogénico ou da base do 
                Miocénico, enquanto que a “frente” corresponde aos 
                Conglomerados, Arenito e Margas de Picheleiros 
                (Paleogénico) nos quais se desenvolve a vertente abrupta. O 
                “reverso” desta costeira incluí litologias diversas do Miocénico.
                     
                Considerações sobre 
                a geologia da Arrábida
                As principais conclusões que 
                se retiram do estudo tectónico e paleogeográfico da Arrábida 
                são: 
                1)                      
                A existência de 2 sistemas de falhas normais durante as 
                fases distensivas Mesozóicas orientadas aproximadamente N-S e 
                E-W. As primeiras, mais importantes, foram reactivadas como 
                rampas laterais durante a inversão tectónica do Miocénico; as 
                segundas, provavelmente rampas laterais extensionais durante o 
                Mesozóico, foram, na inversão miocénica, reactivadas como 
                cavalgamentos. 
                 
                2)                      
                A estruturação herdada das fases distensivas promoveu uma 
                importante compartimentalização da região, a qual influenciou 
                significativamente quer a localização dos principais acidentes 
                tectónicamente  activos durante a deformação compressiva da fase 
                de inversão, quer o estilo da inversão, muito dependente da 
                localização da região, junto aos bordos estruturais da Bacia 
                Lusitaniana. 
                 
                3)                      
                Verificou-se que os movimentos do soco durante a inversão 
                foram relativamente importantes, ou seja, o estilo da inversão 
                nesta região, é o resultado da combinação de deformação thick 
                skinned e deformação peculiar, como sugere Coward (1996) 
                reinterpretando estruturas de inversão noutras bacias.
                
                 
                4)                      
                Estimou-se o encurtamento (e = 35%, seg. Ramsay, 
                1967) paralelamente à direcção compressiva horizontal máxima, no 
                segmento deformado, de aproximadamente 10km, entre Quinta do 
                Anjo, a norte (loose line) e Albarquel a sul (pin 
                point), no sector leste da cadeia da Arrábida, atravessando 
                as estruturas da Serra de S. Luís e do Viso. Se considerarmos o 
                compartimento da Bacia Lusitaniana limitado a sul pela cadeia da 
                Arrábida e a norte pela estrutura de Sintra, assumindo que a 
                deformação produzida pela inversão Miocénica está practicamente 
                concentrada na cadeia da Arrábida, o encurtamento estimado para 
                o interior deste compartimento é e = 6%, valor idêntico 
                ao estimado para o compartimento limitado pelas falhas do Arrife 
                e da Nazaré (Ribeiro et al., 1996). 
                 
                5)                      
                Concluiu-se que  o cavalgamento da Serra de S. Luís 
                reactivou uma falha normal do Malm. 
                 
                6)                      
                A análise das estruturas do Mapa Tectónico em conjunto 
                com dados geofísicos (Silva et al., in prep) 
                contribuiu para a determinação da profundidade do nível de 
                descolamento sob a cadeia, no complexo evaporítico Hetangiano (» 
                3.5 km a N e 2.2 km a S). 
                 
                7)                      
                A existência de constricção fica demonstrada por: 1) 
                desenvolvimento de 3 cavalgamentos imbricados em sequência 
                retrogradante, 2) rotação do anticlinal do Viso, 3) presença de 
                estruturas de escape vertical de que é exemplo a dobra quase em 
                bainha do anticlinal do Viso. 
                 
                A geometria  elegante e 
                simples da cadeia da Arrábida deve-se à existência de apenas um 
                nível de descolamento ou, pelo menos, de um nível principal de 
                descolamento – o complexo evaporítico Hetangiano – 
                estratigraficamente localizado muito próximo da interface 
                soco/cobertura. A tectónica peculiar observada é apenas 
                responsável pela translacção da cobertura e dobramentos gerados 
                durante a propagação dos cavalgamentos, não causando complexação 
                estrutural da cadeia. Por outro lado, a cinemática de 
                desligamento esquerdo ao longo das falhas NNE-SSW a N-S resulta 
                das condições de fronteira do bloco da Arrábida e do indentador 
                tectónico de Lisboa (Fig. 17).  
                
                  
                As estruturas do sector leste 
                da cadeia foram acentuadas pela actividade do indentador 
                tectónico de Lisboa, que contribuiu para a remobilização da 
                camada evaporitica hetangiana, localizada no limite 
                soco/cobertura da Bacia Lusitaniana; esta remobilização promoveu 
                o escape de material da camada evaporítica obliquamente á 
                direcção de máximo encurtamento da cadeia, alimentando o diapiro 
                de Pinhal Novo, localizado a N de Setúbal, na falha 
                Setúbal-Pinhal Novo (Ribeiro et al., 1996).
                 
                A comparação da geometria das 
                estruturas de deformação localizadas a tecto e a muro das rampas 
                frontais salienta forte contraste entre elas. Os sinclinais a 
                muro, com flancos inversos bem marcados estão bem desenvolvidos 
                enquanto os equivalentes anticlinais a tecto das rampas 
                cavalgantes são dobras muito amplas, com flancos inversos 
                ausentes ou mal desenvolvidos. Estas características indicam que 
                estas estruturas compressivas são dobras produzidas em 
                consequência da movimentação cavalgante nas rampas frontais (fault 
                propagation folds), contrariamente ao modelo clássico 
                segundo o qual as primeiras estruturas a formarem-se são as 
                dobras, as quais serão posteriormente recortadas pelo 
                desenvolvimento de falhas inversas nos seus flancos curtos.
                
                 
                A maior deformação 
                constritiva observada no Viso, comparada à deformação do 
                anticlinal da Serra de S. Luís é uma boa evidência estrutural 
                para a retro-migração das rampas frontais que definem a 
                estrutura imbricada deste sector da Cadeia da Arrábida (piggyback 
                structure), como tinha sido proposto por Ribeiro et al. 
                (1990) com base nas evidências estratigráficas. 
                 
                Esta retro-migração das 
                rampas cavalgantes foi muito provavelmente induzida pela 
                existência, a sul da cadeia, de um bloco constituído por um 
                horst de soco orientado E-W/ENE-WSW, que terá actuado como 
                barreira de resistência à sequência sedimentar durante a 
                compressão. A presença deste horst de soco é corroborada 
                por sondagem profunda (Golfinho 1) que atingiu o soco 1700 m 
                abaixo do nível do mar, a sul da Cadeia da Arrábida, enquanto na 
                estrutura da Serra de S. Luís o soco está a cerca de 3 km.
                
                 
                O sector oriental da Cadeia 
                da Arrábida define uma estrutura imbricada 3D (Fig. 18), formada 
                por cavalgamentos sobrepostos de direcção ENE-WSW vergentes para 
                S e rampas laterais esquerdas oblíquas aos cavalgamentos, 
                orientadas segundo NNE-SSW a N-S.  
                A conexão entre as rampas 
                laterais e frontais neste sector da Cadeia da Arrábida é 
                semi-dúctil, isto é, os cavalgamentos orientam-se 
                perpendicularmente às rampas laterais longe delas, e fundem-se 
                gradualmente nas rampas laterais à medida que delas se aproximam 
                (Fig. 3a) (Kullberg et al., 1995). Assim se definem os 
                duplexes representados no Mapa Tectónico.  
                
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