
       por Joaquim Oliveira
       
                   
        Entre Aldeia Rica e Oleiros há uma quinta que foi de Tristão da Cunha, 
       neto do herói da Índia do mesmo nome, e fundador da Casa dos Pavolides. O 
       seu palácio ardeu no princípio do século XIX, restando dele somente as 
       paredes. Dessa quinta, a da Torre,  e de seu palácio, se falará a seguir 
       : 
       
                   HISTORIAL
       
                   Ruy Gomes da Grãa " (...) Governador da Excelente 
       Senhora, (a Infanta Dona Joana,  irmã do Rei Dom João II), do conselho 
       d'El-Rei Dom Manuel I , instituiu, pensa-se,  por volta de 1510 - 1520 , 
       o morgado da Quinta da Torre ... ".
       
                   Vem o nome deste morgado, de uma 
       torre que Ruy Gomes da Grãa, mandou levantar no ângulo nascente da 
       fachada principal do palácio da quinta, até então chamada de Val-de-Rios.
       
       
                   D. Isabel de Menezes, filha de Ruy Gomes da Grãa e de D. 
       Maria de Menezes, Camareira da Infanta Dona Joana, casou com D. Simão da 
       Cunha, general do Mar da Índia e trinchante-mor de Dom João III. Deste 
       casal nasceu um filho, ao qual foi dado o nome de Tristão da Cunha, o  
       mesmo  de  seu  famoso avô paterno, o herói da Índia. Seria este, segundo 
       Tristão da Cunha, que mandaria subir a torre mandada construir por seu 
       avô, Ruy Gomes da Grãa para "poder avistar as naus da Índia velejando 
       defronte de Belém ...".
       
                   Tristão da Cunha, casaria com D. Helena de Ataíde e assim se 
       iniciaria o tronco Cunha de Ataíde, Condes de Pavolide e de Sintra, entre 
       os  quais, foram administradores do vínculo os seguintes:
       
                   Tristão da Cunha Ataíde,  Luis da Cunha Ataíde, (1º senhor de 
       Pavolide), Tristão da Cunha Ataíde e Melo (1º Conde de Pavolide), Luiz 
       Vasques da Cunha Ataíde,  José da Cunha e Melo, Luiz José da Cunha Ataíde, 
       todos com o título de Condes de Pavolide . Seguiram-se-lhes António Cunha 
       (Conde de Sintra), José Luiz Menezes (Conde de Valadares),  e D. 
       Francisca de Noronha, irmão do anterior proprietário e casada com Marco 
       da Silva Noronha (Conde de Vagos), o qual por morte da mulher, herdou o 
       vínculo e foi o seu último possuidor.
       
                   Dois destes administradores do morgado da Torre, Tristão da 
       Cunha Ataíde e seu filho Luiz da Cunha Ataíde figuram entre os conjurados 
       de 1640, tendo participado activamente no acontecimento que devolveu a 
       Portugal a sua Independência.
       
                   Depois da extinção do morgado a quinta foi vendida, em 1894, 
       pelo Conde de Vagos a  D. Ana Luisa Esteves e em 1928 por esta senhora a 
       António Maria Carvalho.
       A  
       QUINTA  ATRAVÉS  DOS  TEMPOS
       
       
       
                   O morgado da Quinta da Torre, ao tempo da sua instituição, 
       compreendia uma área muito considerável que se extremava com a Quinta da 
       Nogueira e a "Coutada da Serra da Arrábida", estendendo-se por 
       terrenos onde estão hoje implantadas Aldeia Rica, Oleiros e Aldeia de 
       Irmãos. O desmembramento desta grande propriedade, motivada por inúmeras 
       concessões de aforamentos e aprazamentos, deram origem às  Quintas da 
       Aldeia Rica e do Meio, à Quintas do Maia e do Negrão, à de Cima, do 
       Cabral e de Santo António, assim como à Quinta do Vale do Pereiro, do 
       Guedes, do Lemos e do Casal do Besugo, do Olival do Negrão e dos Caracois. 
       Pertencia-lhe ainda, o Olival das Baldrucas , hoje largo do mesmo nome e 
       que está incorporado na Quinta do Cabral.
       
                   Quando a Quinta da Torre  foi  vendida em 1894 a D. Ana Luisa 
       Esteves, pela escritura de venda, lavrada a 14 de Agosto desse ano, 
       fica-se a saber que o seu parco património era constituído por "casas, 
       abegoaria em mau estado, vinha, terras, árvores frutíferas e silvestres, 
       poço, tanque e matos ".  
        
       O  
       SOLAR
       
       
       
                   "Ergue-se o solar de Val-de-Rios na extremidade Oeste dos 
       Montes de Azeitão, entre Aldeia Rica e Oleiros, no caminho que por Cóina 
       leva a Sesimbra. Atrás, debruçadas sobre o Val-de-Pereiro, ficam-lhe as 
       alturas do Vesugo com seus moinhos, e mais longe a serra da Arrábida, 
       limitando o horizonte para Sul ; em frente, olhando ao Norte, a vista 
       alonga-se pela planura verde-bronze dos brejos e pinhais, até encontrar a 
       foz do Tejo. No ângulo nascente da fachada principal, voltado ao Norte, 
       destaca-se a torre que Rui da Grãa fez levantar e Tristão da Cunha mandou 
       subir, para avistar as naus da Índia velejando defronte de Belém. 
       Em frente da fachada principal, voltada ao Norte, ao centro do pátio 
       nobre um tanque circular "onde nadam peixinhos coloridos e boiam pálidos 
       nenúfares".
       
                   Em 1830, o solar que era habitado por Vasco de Villalobos e 
       sua mulher D. Maria Benedita foi vítima de  "um incêndio furioso que 
       consome a  ala poente do solar e atinge o corpo central ... " e quase 
       vitima a filha do casal, chamada Maria D'El-Carmen,  porque sua mãe "a 
       consagrara à milagrosa Senhora venerada na capela que D. Madalena Giron, 
       segunda duquesa de Aveiro por seu marido, morto em Alcacer-Quibir, 
       mandara erguer na vertente Oeste da serra da Arrábida".
       
                   Desabitado e abandonado o Solar, era tão desoladora a 
       situação de ruína, que só as paredes enegrecidas e os vestígios da torre 
       de Ruy da Grãa poderiam lembrar que tivesse ali havido vida. Tão extrema 
       era a situação, que em 1833, o que foi em tempos o pátio da fachada Sul, 
       serviria, em recurso, para Campo Sagradol.
       
                   No fatídico ano de 1833 uma epidemia de cólera-mórbus,  que 
       teve origem nas margens sagradas do Ganges, na Índia, chegou à Península 
       Ibérica pela porta da cidade do Porto, aberta à navegação oriunda do 
       Oriente. Rapidamente a epidemia se espalhou pelo litoral e só em Lisboa 
       foram contados mais de 13 mil óbitos, numa população de 300 mil.
       
                   A região de Azeitão  não ficou isenta desta epidemia, havendo 
       o registo de 224 mortos,  entre os quais o ilustre azeitonense Joaquim 
       Pedro Gomes de Oliveira, ministro do Reino em 1821 e 1823. 
       
                    O Adro da Igreja de São Lourenço, no tempo e como uso na 
       época, servindo de cemitério, não comportava todos os corpos. Numa 
       situação de recurso, e de precaução para evitar maior contágio, foi 
       utilizado o já citado pátio, por detrás das ruínas do Solar. No local, 
       passado a ser conhecido por Defuntos, houve durante muitos anos um 
       cruzeiro a assinalar o facto. 
       
                   Por consequência do incêndio e do estigma de morte e desgraça 
       que acompanhou o local, ficaria definitivamente inviabilizado a 
       possibilidade da  reconstrução do Solar. 
       
                   Segundo a tradição, as mortes ocorridas aquando do incêndio, 
       a loucura que  pelo mesmo motivo teria acometido a proprietária, e a 
       morte prematura de seu marido, ainda hoje, dão ao local um certo mau 
       augúrio.