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Sebastião da Gama

[Museu Sebastião da Gama]

[A Região dos Três Castelos – circuito turístico]

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por Maria Helena Horta


Sebastião da Gama aos 22 anos na Pousada de Stª Maria da Arrábida Mais de cinquenta anos de Poesia, Poesia exigida por novos leitores, em edições sucessivas que de imediato se esgotam, só pode ser considerado um fenómeno. Fenómeno do bom gosto e da sensibilidade poética dos leitores que ao fim destes longos anos de sucessivas gerações, reconhecem em Sebastião da Gama um grande Poeta Português. Serra-Mãe não existia sem Sebastião da Gama, seu autor. E o Poeta escreveria com o mesmo entusiasmo e entrega se não existisse nele aquela vida interior, conquistada no silêncio, na beleza e no mistério do espaço - Serra e Mar - onde permanentemente se movimentava? Serra da Arrábida, Mar e Sebastião da Gama formam uma simbiose tão perfeita que leva o Poeta, numa entrega de amor total a reconhecê-la quando escreve:

"e o casamento do cheiro a maresia

com o perfume agreste do alecrim

e os gritos mudos

das rochas sequiosas

que o Sol castiga passam a dar-se em mim."

No prosseguimento do poema, acima citado, é o próprio Poeta que nos diz: "Chego a julgar a Arrábida como Mãe", mas noutro momento de inspiração refere-se ao Mar com o mesmo amor:

"Ai!

berço da tua voz

e esse jeito de mão que tens nas ondas Mar!

...

hás-de ser quem me trate

quero que sejas tu a minha Mãe."

Ao recordar o Poeta vem-me à lembrança o Homem e o Professor que conheci na minha adolescência, que quando tinha aquele brilhozinho feliz no olhar, era sinal de que havia nascido um novo poema. Então rodeava-me os ombros com um braço enquanto a outra mão segurava um papel (um papel qualquer) que eu já adivinhava ser um lindo poema. Em plena rua, ou no pátio da escola, em voz alta e com a alegria pura dum menino, ia lendo o seu poema. Por fim vinha sempre a mesma pergunta: - Gostaste, Maria Helena? Como não haveria de gostar do poema, se ele, como chuva miudinha entrava de leve na minha sensibilidade, já nessa altura aberta à Poesia.

Em Serra-Mãe, seu primeiro livro, descobre-se uma Arrábida, só por alguns conhecida, feita de carreirinhos peregrinos correndo ao encontro de matas frondosas onde se esconde o bufo nos penhascos, onde o folhado cala o seu perfume e onde a rosa albardeira, flor de pétalas rosadas e sedosas como as pétalas das tulipas, é a rainha do mês de Abril. Em Serra-Mãe descobre-se o Poeta, na plena nudez de preconceitos que o levam a mostrar-se tal como é, exuberante na alegria de viver: "Minha alegria vive qual rubra flor ao Sol abre-se toda pura De minha vida não sei, senão que sou feliz." Nudez de preconceitos que o levam a confessar-se um bom conversador, um amigo sempre disponível para amar, para receber quem quer que seja que bata à sua porta e que nos lança um repto: "Quem me quiser amar, que me leve fechado no meu mistério" E é a Serra-Mãe, enteada na noite e respirando silêncio, que guarda o Mistério do Poeta, o seu Segredo de Amar e os poemas que não escreveu.

 

Convento da Arrábida

A vida de um grande Poeta

por Ana Duarte

Sebastião Artur Cardoso da Gama nasceu em Vila Nogueira de Azeitão, a 10 de Abril de 1924, filho de Ana Cardoso da Gama, doméstica e de Sebastião Leal da Gama, comerciante. Foi o mais novo de três irmãos varões. O mais velho morreu ainda o poeta não era nascido. Aprendeu as primeiras letras com o professor Pinheiro, na Escola Primária de Vila Nogueira de Azeitão. Usava sempre calção, camisa, lacinho e guardava os seus livros numa sacola que transportava ao ombro, quando a pé percorria o caminho que separava a casa da escola.

Aos catorze anos foi acometido de uma tuberculose óssea. O seu médico assistente, Dr. Dórdio, aconselhou a família a interná-lo no Sanatório de Outão; no entanto, seu pai, desgostoso com a ideia, alvitrou a hipótese de o jovem Sebastião se instalar na Arrábida com sua mãe, numa casa alugada. O médico aderiu à ideia e a partir dessa idade o poeta passou a viver num cenário paradisíaco, que foi o pano de fundo da sua poesia. A serra e o mar invadiam-lhe o olhar permanentemente, e os passeios, pesquisando os mais recônditos lugares da Arrábida, passaram a ser obrigatórios no quotidiano de Sebastião. A facilidade de comunicação, a alegria e a graça do seu carácter permitiram-lhe entrar na vida das gentes simples da Arrábida e Azeitão. A sua poesia fala dos sentimentos dos pescadores e homens da terra e tanto os considerou que fez deles seus amigos predilectos. Contam os seus amigos que, quando defendeu a sua tese de licenciatura, o arguente criticou a sua sintaxe, porForte de Stª Maria da Arrábida , ser muito popular, ao que o poeta retorquiu que era muito natural, pois ele dava-se mais com gente do mar e lavradores do que com doutores muito letrados. A família de Sebastião da Gama resolveu, em dada altura, mudar para uma casa maior na Arrábida. Escolheram o forte que estava abandonado e pouco a pouco transformaram-no em restaurante e pousada, fazendo desse empreendimento a sua nova forma de subsistência.

Terminados os estudos da escola primária, iniciou no Liceu Bocage o ensino secundário, que infelizmente teve de interromper, por causa da inesperada doença aos catorze anos, Até aos 18 anos um explicador deslocou-se metodicamente à Arrábida duas vezes por semana e assim fez os seus exames até ao sétimo ano (hoje 11º), como aluno externo. Começou por esta altura a trocar correspondência com aquela que viria mais tarde a ser sua mulher. Fez exame de admissão à Faculdade de Letras de Lisboa em 1942 e frequentou, como aluno voluntário, todo o curso de Românicas.

Foi companheiro de Lindley Cintra, de Eurico Lisboa, de Matilde Rosa Araújo, da presidente do Centro Cultural Português da Fundação Calouste Gulbenkian em Paris, Maria de Lurdes Belchior e de Fausto Lopo Carvalho, entre outros. Começou a publicar na "Gazeta do Sul", um jornal do Montijo, os seus primeiros versos, assinando com o pseudónimo "Zé d'Anixa". Mais tarde publicou também nas revistas literárias "Sísifo", "Brotéria", "Árvore" e "Távola Redonda". Na sua tese de licenciatura dissertou sobre a poesia do séc. XIX. Mal terminou o curso foi colocado em Setúbal, como professor provisório na então Escola Comercial e Industrial João Vaz, no local onde hoje está instalado o Colégio Diocesano, Só leccionou um ano nesta cidade, mas mesmo assim deixou de imediato uma marca no coração dos seus alunos, que ainda hoje o recordam. Fez o estágio pedagógico na Escola Veiga Beirão, em Lisboa, e durante esse período escreveu o "Diário". Neste relata o quotidiano de um professor que aplicou na época aquilo que hoje são as modernas pedagogias.

Introduziu nas aulas um ensino individualizado, tendo em conta as particularidades de carácter de cada aluno, imprimindo neles o amor pela vida e pela poesia, e fomentou as discussões dos problemas, abertamente, no local mais apropriado: a sala de aula. Aos fins de semana continuou as suas peregrinações pela Serra Mãe, nome com que apelidou a Arrábida, em companhia dos seus amigos. Durante a sua estada em Lisboa, como aluno universitário, Sebastião da Gama vive um momento de grande importância para a sua vida, como ele próprio relata nas missivas à sua noiva Joana Luisa, Sebastião comunga pela primeira vez aos 21 anos. A serra e o contacto com a natureza revelaram-lhe Deus e toda a sua magnitude. Depois de longa reflexão, o jovem poeta decide converter-se à religião católica, que nunca abandona até à sua morte. Terminado o estágio foi colocado como professor em Estremoz. Dois anos antes, estando para casar, a doença revelou-se implacável: uma tuberculose renal obriga-o a adiar o casamento. Com novos medicamentos, o poeta recompõe-se e casa com Joana Luísa de Oliveira Rodrigues Gama, sua única noiva, vizinha e amiga de infância. A cerimónia realizou-se no Convento da Arrábida e, por deferência especial do proprietário do Conventinho, o casal passou aí a sua lua-de-mel. Em Estremoz alugara uma casa no Largo Espírito Santo, referendada também nos seus versos. Entretanto tinha publicado, em edição de autor, os livros de poemas Serra Mãe, Cabo da Boa Esperança e Campo Aberto. Neles espelha o seu estado de alma, uma relação constante com a natureza, materializada pela Serra da Arrábida, e com Deus. A doença agrava-se e, passados sete meses de casado, Sebastião da Gama ingressa no hospital em Lisboa, vítima de uma meningite renal. Morre a 7 de Fevereiro de 1952, com apenas vinte e sete anos de idade.

Desde então, a sua mulher tem promovido a edição dos seus inéditos: Pelo Sonho é que Vamos, Diário, O Segredo é Amar, Itinerário Paralelo. Convento da Arrábida Foi sepultado em Vila Nogueira de Azeitão, onde é uma figura presente e um ex-libris para os azeitonenses. Os alunos de Setúbal, de Estremoz e de Lisboa, assim como várias instituições, têm-lhe promovido várias homenagens. Na sala nº 19 da Escola Veiga Beirão foi assinalada a sua passagem como professor dessa escola. Na sua casa de Azeitão, tal como na de Estremoz, foram colocadas lápides comemorativas, na Arrábida foi colocado um monumento em sua honra. A Escola Secundária de S. Julião de Setúbal, assim como o colégio Diocesano, tomaram o nome de Sebastião da Gama. Exposições sobre a sua vida e obra nos seguintes locais: Museu de Setúbal; Convento de Jesus; Casa de Bocage; Casa do Povo de Azeitão; Escola EB 2.3 de Azeitão; Sociedade Recreativa União e Progresso, em Vendas de Azeitão. Sessão solene de homenagem no Salão Nobre da Câmara Municipal de Setúbal. Instituição do Concurso de Poesia "Sebastião da Gama" pela junta de Freguesia de S. Lourenço e S. Simão de Azeitão (que a bem da verdade, mais divulgação poderia ter. Homenagem pública na Escola EB 2.3 de Azeitão, com várias individualidades presentes, entre elas o senhor Bispo de Setúbal. Sebastião da Gama tem sido tema de muitos artigos em jornais e revistas, assim como leitura obrigatória em quase todas as escolas do país.

A sua viúva continua a trabalhar na divulgação dos inéditos ainda existentes e os seus ex-alunos de Azeitão, Lisboa e Estremoz continuam, persistentemente, a divulgar esta figura que conseguiu ser tão marcante na vida de tantas pessoas como poeta e como homem.

Nota: Foi inaugurado no dia 1 de Junho de 1999, em Vila Nogueira de Azeitão, o Museu Sebastião da Gama, constituído pelo espólio que deixou. 


Sobre Sebastião da Gama

"Conheci-o no Verão de 1945, candidato à admissão à Faculdade de Letras. Tinha ele então dezoito anos. Impressionavam, desde o primeiro contacto, a sua espontaneidade, a sua franqueza, a vivacidade e a pureza do seu olhar, e também a sede de convivência, de comunicação, que o levava a entrar rapidamente em contacto com todos os que o rodeavam.( ... ) "Em breve nos tomámos amigos, Foi graças a essa amizade que comecei, a partir de 1943, a ser um dos primeiros a conhecer os poemas que viriam a formar Serra-Mãe. Chegava da Arrábida e recitava-me os versos acabados de compor.( ... ) "Com Sebastião da Gama estive no Portinho da Arrábida e percorri a Serra a partir de 1943. É preciso falar do que a Serra representava para o poeta. A beleza do lugar, o seu isolamento e a meditação a que esse isolamento convidava tiveram na sua formação uma influência decisiva.(...) Daí o título do seu primeiro livro e a sua resistência às sugestões de quem lhe aconselhava que o mudasse.(...)"

Luís Filipe Lindley Cintra - Do Prefácio de Serra-Mãe

"Campo Aberto, que contém poemas dos anos de 1947 a 1950, está subdividido em capítulos: Lua Nova, Paraíso Perdido, Viagem, Caixinha de música, A companheira, A verdade era bela, capítulos precedidos de dois poemas, Campo Aberto e Louvor da Poesia, e rematados pelo poema intitulado Senhora da Lapa. A repartição das composições por cada um destes capítulos obedece a uma espécie de agruparão temática. No primeiro grupo estão poemas quase-românticos, onde o tema da morte domina; no segundo toma-se presente uma espécie de nostalgia e a sensação magoada de fazer perguntas sem resposta (porquê a ausência, a dor, a inquietação?) (... ) No terceiro grupo estão juntos os poemas de viagens verdadeiras ou simbólicas; e no quarto grupo, Caixinha de música, encontramos composições de teor e toada populares e um temário infantil ou ligado à infância;( ... ). A companheira, título do quinto grupo de poemas, abrange os poemas de Amor stricto senso;( ... ). Finalmente, o mais extenso dos grupos, encabeçado pelo poema "A verdade era bela"; nele se albergam, entre outros os poemas "Alegria", "Quatro mil soldados", "Apolo", etc.

Maria de Lourdes Belchior - Do Prefácio de Campo Aberto

"No entanto, aqui [em Pelo Sonho é que Vamos] Sebastião da Gama inaugurava realmente uma nova fase da sua vida. Era o poeta recém-casado a cantar em ritmos novos (na sua poesia a renovação dos motivos implica sempre uma renovação formal), a sua nova situação. Era o poeta finalmente dotado de uma musa própria, o poeta experiente, senhor do seu oficio. Era a poesia da maturidade de um adolescente, como ele próprio se reconhece em 'Regresso à montanha'."

Ruy Belo - Do prefácio de Pelo Sonho é que Vamos

"Este Diário, que Sebastião da Gama deixou manuscrito, é o registo quotidiano das suas experiências de estagiário do Ensino Técnico, e seria não se sabe até que altura o programa da sua carreira de professor, se a Morte lhe não houvesse tão prematuramente posto termo. (... ) "Professor e poeta, afinal mostra este documento como eram duas faces da mesma fisionomia espiritual, como se integravam na realidade concreta duma singularíssima alma, como em toda a minha longa vida de professor me não foi dado conhecer outra.( ... )"

Hernâni Cidade - Do prefácio do Diário

"Ao tentar organizar esta série de páginas, um título se me impôs de raiz tão cara a Sebastião: O Segredo é Amar. "Sebastião sempre o soube desde menino, e nunca o desaprendeu - e todos o sabemos desde crianças e o desaprendemos mais tarde -, que o segredo é amar, "Foi esse segredo natural que gritou a sua pedagogia de poeta e professor, segredo natural de vida que é o dos verdadeiros homens. Viver para Sebastião foi amar. Amar numa dádiva total. E na sua prosa, talvez mais do que na sua poesia, pelo que ela tem de coloquial, de vivo, sem intenção de forma acabada, transparece a sua inquietação entregue por um amor sem cálculo e sem medida."

Matilde Rosa Araújo - Do prefácio de O Segredo é Amar

"A matéria adiante exposta constitui praticamente um terço da produção poética de Sebastião da Gama, entre 1942 e 1947, que até agora permanecia inédita. São, por conseguinte, versos escritos entre os 18 e os 23 anos do autor, contemporâneos daqueles que viriam a ser impressos em Serra-Mãe (1945) e no Cabo da Boa Esperança (1947), - uma espécie, digamos, de «itinerário paralelo», de onde melhor podemos observar a estrada aberta por esses dois livros."

David Mourão-Ferreira - Do prefácio de Itinerário Paralelo

"As cartas que hoje se publicam dizem de um amor humano intenso, apaixonado, confiante. Mas neste dizer-se não há egocentrismos absorventes: o coração do poeta alarga-se às dimensões do mundo, está profundamente ancorado em Deus, e relaciona-se quase sempre do mesmo modo franciscano com as criaturas: homens e natureza. "Estas cartas para a sua noiva são uma espécie de diário. Nele se retrata o homem, com o seu temperamento, os seus altos e baixos, num desejo de mostrar-se àquela que ama tal qual é ou tal qual julga ser. O itinerário do poeta, a «gestação» de Serra-Mãe vão-se delineando de carta para carta. E as «experiências» de Deus, frequentes, deixam-nos entrever algo da alma de Sebastião da Gama."

Maria de Lourdes Belchior - Do prefácio de Cartas 1


Bibliografia

A bibliografia que aqui se apresenta pretende dar conta das diferentes edições da obra do poeta e, ao mesmo tempo, registar os estudos mais significativos que ela suscitou. Não tem pretensões de exaustividade; apenas nos move o intuito de deixar um instrumento de referência para os que desejarem ultrapassar as limitações deste pequeno folheto. Esperamos que esta recolha possa vir a ser de alguma utilidade.

ACTIVA

Poesia