artigo publicado no Jornao de Azeitão em 2000

O CRESCIMENTO DE/EM AZEITÃO

                                                           por Bernardo Costa Ramos

«O ritmo de construção de casas em Portugal é o dobro da média comunitária», este é o início da noticia de primeira página do 2º caderno do Jornal Expresso (18 de Dezembro 2000). Impulsionador desta dinâmica foi, sem dúvida, a grande descida que as taxas de juro registaram nos últimos tempos, fazendo com que os portugueses (segundo um estudo da Euroconstruct) tenham uma média de três casas  por cada duas famílias (na Europa em geral a média é de 1 para 1).

 

Passado

Azeitão, região típica, bem localizada, lugar de bons ares onde a serra e o mar se encontram, foi sendo escolhida ao longo dos séculos como lugar perfeito para a fixação de “boas gentes”. Várias quintas se implantaram e  pequenas povoações foram surgindo com a fixação dos trabalhadores que vinham fazer a jorna nas mesmas.

 

Presente

A procura de casa nesta zona tem sido cada vez maior, levando a que as leis do mercado tenham seguido o seu rumo natural: muita procura e pouca oferta = preços especulativos/proibitivos. De facto, torna-se difícil, para a maior parte das bolsas, acompanhar a subida de preços, onde a média de custo por uma moradia ronda os 40, 50 mil contos.

Um dos problemas que se gera é por exemplo a escassa oferta de habitações, a preços suportáveis, para os casais mais jovens da zona. Não tendo posses para ir para os “altos voos”, resta a hipótese de viver com os pais, remodelar uma casa de família ou comprar um dos poucos apartamentos que por vezes surgem. O único senão é que estes apartamentos rondam os vinte e muitos mil contos e os que surgem são rapidamente vendidos, levando a que estes casais sejam geralmente obrigados a mudar para zonas mais acessíveis e mais distantes da sua terra.

 

Efeitos

Toda esta procura levou a que ultimamente surgissem na vila de Azeitão e aldeias circundantes variados loteamentos e urbanizações.

Na vila e tendo como referência a Rua José Augusto Coelho (que atravessa Azeitão), podemos tentar localizar alguns dos focos mais visíveis deste novo boom urbanístico: para baixo, junto da Sociedade Filarmónica constrói-se a um ritmo lento as numerosas habitações da Cooperativa de habitação, que contrastam fortemente com as moradias que surgem no outro lado da estrada (que foram tirar uns metros de terra à Quinta dos Foios). Mais abaixo, ao pé da Escola Básica 2.3 de Azeitão, surge a bom ritmo um  condomínio de luxo.

Para cima, por detrás da Quinta do Convento surgem duas urbanizações: a Urbanização da Cerca e a Urbanização da Quinta do Convento, estando a surgir na Quinta do Fisco aquilo que parece ser mais um loteamento ou urbanização.

Saindo da vila em direcção à aldeia de Oleiros surge o loteamento Olival D. Marta que irá ver surgir 44 moradias, num espaço total de 32 mil metros quadrados. Seguindo pela estrada nacional e à saída da Aldeia de Irmãos o loteamento Monte da Vinha (monte ??), com uma área duas ou três vezes superior ao Olival D. Marta.

 

Preocupações

Não pretendo com este artigo fazer uma apologia do “não crescimento” ou da “não construção”. Pretendo sim chamar a atenção para o modo como esse crescimento se efectua. O crescimento urbanístico nesta zona deveria seguir regras (nº de pisos, cor, tipos de materiais, espaços em redor, etc) que garantissem a tipicidade da mesma, de modo a evitar casos concretos, já surgidos, de claro desenquadramento, como, por exemplo, a estação de correios de Azeitão, a sucursal do banco CPP em Vendas, o prédio e moradia à entrada de Aldeia de Irmãos, etc. Uma pergunta fica no ar: Como foi possível autorizar-se a construção de tais edifícios?

Não deixam de ser preocupantes outras situações que ocorrem de modo a ser possível construir e crescer: caso chocante é sem dúvida a destruição da Quinta do Estacal (Aldeia de irmãos), para se construir mais uns lotes do Monte da Vinha. As quintas vão-se desmembrando, esquecendo-se que das quintas surgiu esta terra.

Outro caso são as vedações de arame farpado que vão surgindo pela serra, em pleno Parque Natural, bem como as construções que abrem novas estradas, novos rasgos numa paisagem que cresceu connosco. É triste perderem-se algumas das referências que estão intimamente ligadas ao nosso crescimento, às brincadeiras, passeios, “tropelias”. O espaço limita-se. Um dia apenas poderemos seguir o conselho sábio de M. Montaigne «Uma imaginação robusta cria os acontecimentos». Imaginemos, imaginemos...

O crescimento da região de Azeitão tem de ser controlado, devendo-se apostar unicamente na qualidade e nunca na quantidade.

Devemos ter sentido critico para ver o que está bem e o que está mal, melhorarmos aquilo que nós temos, recuperar/restaurar o nosso património, dar a conhecer a nossa história.

É altura de cuidarmos do que é nosso, de criarmos uma força reivindicativa que nos faça ter um lugar junto de quem decide, até, um dia, sermos nós próprios a decidir o nosso caminho.